A propósito da erosão costeira, tem algum interesse este artigo do
Jornal i, da autoria de Diogo Pombo:
Erosão da zona costeira.
Todos se queixam do mar e a culpa é 90% do homem
O mar vai ganhando metros às praias do país, mas só
10%a 15% da erosão é natural se deve à subida do nível da água.
As praias são como um rio de areia. E como qualquer
rio, têm uma nascente e uma foz. É costume "dizer-se que as praias nascem
nas montanhas", defende João Alveirinho Dias, mas também já é frequente
ver "as praias a morrerem no caminho para o mar", lamentou o
especialista em Dinâmica Sedimentar. E só uma parte pequena da culpa se deve à
subida do nível médio da água ou a fenómenos como o ocorrido no início deste
mês, em que ondas gigantes galgaram terra adentro em vários locais da costa de
Portugal Continental - entre 85 a 90% da erosão costeira encontra a sua causa
no lado do homem, garante o investigador. E os portugueses importam-se "muito
pouco" com isto.
A linha entre o Douro e a Nazaré é um exemplo
"paradigmático" de como a acção humana, aliada aos factores naturais,
em muito agrava o desgaste das zonas costeiras. "Em condições naturais as
areias vinham essencialmente do rio Douro, chegavam ao mar e, devido à acção
das ondas, eram transportadas para sul, ao longo do litoral", explica João
Alveirinho Dias, da Universidade do Algarve. Se um rio seca quando "deixa
de haver água nas nascentes", também as praias "nascem nas montanhas"
mas acabam "por morrer no caminho", devido à "cascata de
barragens" que se construiu ao longo do Douro, avisou o investigador.
BARRAGENS Hoje a contagem
vai em 64 barragens, explica Adriano Bordalo e Sá. O hidrobiólogo do Instituto
de Ciências Biomédicas Abel Salazar, da Universidade do Porto, relembrou que,
na zona costeira a norte do Mondego, o rio Douro é "o grande fornecedor de
areia" e drena 98 mil quilómetros quadrados, uma área superior à de
Portugal Continental (cerca de 92 mil km²).
A partir da década de 60 e "64 barragens
depois", porém, "o caudal sólido de areias" passou de cerca 1,8
milhões de metros cúbicos por ano para 250 mil m 3. Mas neste
filme de factores humanos "existem vários vilões". As dragagens para
a construção civil ou por motivos de navegação, são um deles. "Retiram uma
quantidade grande de areias dos estuários, que estavam à espera da próxima
cheia para transportar sedimentos para o mar e alimentar o tal rio de
areia", queixou-se o Alveirinho Dias ao i.
No Douro até já houve períodos "em que o volume
de areias legalmente retirado" foi superior "ao transporte total de
areia" registado "durante um ano" pelo rio, alertou Adriano
Bordalo e Sá.
E "não só" se verifica "uma redução do
transporte de areia" devido às barragens, resumiu o hidrobiólogo, como o
homem "intercepta o pouco que sobra". Um pouco que "estava à
espera da próxima cheia para levar sedimentos para o mar e alimentar o tal rio
de areia", explicou Alveirinho Dias. Por ano, esta zona da linha costeira
perde "sete ou oito metros" de areal, alertou o investigador.
OCUPAÇÃO A areia vinda de
rios é cada vez menor, e caso estes cursos de água "não transportem a
quantidade necessária para colmatar falhas", então "o mar
encarregar-se-á de a ir buscar onde ela existe", explicou Adriano Bordalo
e Sá. Onde? "Nos cordões dunares", rematou, antes de remeter para
outro problema - o desordenamento da orla costeira. "De há 30 anos para
cá, qualquer pessoa procurou ter uma casa com vista para a água, nem que fosse
para um balde", criticou o hidrobiólogo.
A par de ausência de "uma gestão costeira
integrada", Bordalo e Sá lamentou que a "legislação portuguesa de
ordenamento da orla costeira" não se aplique sempre que "se entre
numa área sob jurisdição portuária". Em Lisboa, por exemplo, equivale a
não poder tocar numa extensão de 50 quilómetros.
Sem a acção humana restariam sempre os factores
naturais. E aí uma das causas da erosão prende-se com "a mudança de
orientação dominante das ondas", indicou Filipe Duarte Santos. "Na
nossa costa", começou por explicar o investigador da Faculdade de Ciências
da Universidade de Lisboa, a "direcção dominante das ondas é
Noroeste" mas "está a rodar no sentido dos ponteiros do relógio"
- logo, verifica-se "um maior transporte paralelo à costa, de Norte para
Sul".
Depois vem o aumento do nível médio da água do mar:
que "está a subir, vai continuar a subir e está a acelerar todos os
anos".
No verão, estas estacas quase não se viam...